terça-feira, 14 de outubro de 2008

Namorados...

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namoro de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, de saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil. Mas, namorado, mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito, mas aquele a quem se quer proteger; quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa ser forte, decidida ou bandoleira: basta um olhar de compreensão. Quem não tem namorado, não é que não tem um amor: é quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e um amante, mesmo assim pode não ter um namorado!

Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, do cinema, da sessão das duas, do medo do pai, do sanduíche de padaria ou do drible no trabalho. Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa. Não tem namorado quem faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos diários com a felicidade ainda que rápida, escondida, fugida ou impossível de durar.
Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho escondido na hora em que passa o filme; de flor catada no muro e entregue de repente; da poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar; de gargalhada quando fala junto ou descobre algo engraçado; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.

Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer cesta abraçado, fazer compras e passeios intermináveis. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez (ou falta dela) do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira d'água, show do Djavan, bosques enluarados, ruas de sonhos e musical da Metro.

Não tem namorado quem nunca entrou no mar de mãos dadas e ficou lá abraçadinha, com medo de tomar uma surra de uma onda gigante. Não tem namorado quem nunca acordou cedo e o levou para ver o sol nascer...
Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, quem não chateia com o fato de o seu bem ser paquerado. Não tem namorado quem gosta sem aprofundar (impossível!).

Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada ou meio-dia de sol em plena praia cheia de rivais. Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações. Não tem namorado quem confunde ficar sozinho e em paz com solidão. Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e com o outro, e quem tem medo de ser afetivo. Se você não tem namorado porque não descobriu o quanto o amor é alegre, e você vive pesando duzentos quilos de grilos e de medo, ponha sua roupa mais leve e passeie de mãos dadas com o ar, ouvindo os sábios conselhos das árvores...
Enfeite-se com margaridas e ternuras, e escove sua alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de morango e sorria lírios para quem passe debaixo da janela.

Ponha intenções de um lindo jardim em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria: se você não sabe o que é isso é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido!!!

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